
Em sua primeira individual na Portas Vilaseca – “Oríkì Ìwòran ” – o artista Ayrson Heráclito (Macaúbas, BA, 1968) apresenta um vigoroso conjunto de obras – algumas especialmente realizadas para a mostra – em torno da questão do ebó-arte ou arte-oferenda, em que expande o exercício da contemplação para um devir-ritual.
Dando continuidade à experiência sensorial de ambientes imersivos, que marcou sua participação na 35ª Bienal de São Paulo (com Tiganá Santana, 2023), o artista convida agora o visitante a percorrer três recintos que reúnem, no primeiro piso, esculturas e desenhos, das séries Juntós e Orikis, até chegar ao andar superior onde a videoinstalação Orikì de instrução, constituída de sete monitores de vídeo, ocupa todo o espaço, visando despertar uma conexão com elementos da natureza: a terra, a folha, o rio, o vento, o mar, o crepúsculo e o fogo.
Na parede que estabelece a passagem entre os pisos da galeria, Heráclito expõe Inventário de Tecnologias de Cuidado e Cura, inventário de ingredientes associados à força e à cura que habitam a ritualística do Candomblé, entre eles: velas, quiabos, moedas, mel, fumo de rolo, charuto, arroz, ovo etc. Nesse trabalho, o artista revisita sua obra cuja versão anterior lidava com a representação fotográfica (2023), fazendo uso da tradição modernista do grid. A versão para a Portas Vilaseca traz agora a materialidade desses componentes com seus aromas orgânicos. A manutenção dessa obra ao longo do período da exposição remete, ainda, às necessidades de cuidados e responsabilidade institucional que o artista vem discutindo em seus trabalhos.
A curadora e crítica Lisette Lagnado analisa como essa trajetória, construída ao longo de mais de trinta anos, “agrega camadas de complexidade ao cânone que se pretendeu universal e desenvolve uma filosofia do devir, inerente à transmutação do pensamento nagô.” De acordo com ela, “o estado atual do planeta reúne motivos suficientes para justificar buscas de ordem espiritual por orientação e proteção, apelos que talvez mereçam o atributo de ‘sintoma’ quando se considera o atual curso da destruição ambiental que prenuncia a sexta extinção da biodiversidade no planeta em que vivemos”.
A sala de entrada da galeria será banhada de energias relacionadas a equilíbrio, justiça ou renovação, atmosfera transmitida pelas principais divindades africanas, sempre articuladas em duplas na série Juntós: Ogum com Oxumarê, Oxóssi com Omolu, Iemanjá com Tempo, Exu com Xangô. Cada par reflete o orixá primário e o orixá complementar que guiam a vida de um individuo.
Desde 2021, Heráclito vem desenvolvendo a série de Juntós, esculturas em aço inoxidável a partir da combinação de dois orixás. Em paralelo, cada Juntó recebe um Oriki, invocações poéticas na tradição oral yorùbá. Dotados de insumos terapêuticos, esses versos inauguram uma nova etapa no processo criativo do artista, que encontra uma correspondência conceitual nas “instruções” de Yoko Ono, principalmente os haiku dos anos 1960. Este projeto está em andamento e prevê a realização de todas as combinações entre os dezenove orixás, respeitando as exceções por lei: Oxalá só pode ser regente e Oxaguiã não combina com Exu. No total, o sistema contará com 222 combinações.
“Oríkì Ìwòran” será inaugurada no dia 9 de setembro e segue em cartaz até 25 de outubro.
Esperamos a sua visita! Em breve, mais informações.
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Serviço
Oríkì Ìwòran – Ayrson Heráclito
Curadoria: Lisette Lagnado
Abertura: 9 de setembro, terça-feira, 19h
Exposição segue até 25 de outubro
Horário de visitação: de terça a sexta, 11h–19h, sábados, 11h–17h
Entrada gratuita
